“Eu não era dona da minha vida”. Essa frase resume os 14 anos em que Clara (nome fictício), 34 anos, esteve casada com o ex-marido. O relacionamento foi marcado por agressões físicas e tortura psicológica. “No início, ele tinha crises de ciúmes e a situação foi piorando com o passar dos anos, até chegar ao ponto de me ameaçar de morte”, lembra. O fato mais marcante na vida dela foi a agressão que sofreu quando estava amamentando um de seus filhos. “Sofri tanta violência, que as lembranças se misturam, mas nunca esqueço dos momentos em que meus filhos estiveram junto. Eu me separei algumas vezes, mas ele sempre prometia que iria mudar e eu acreditava. Depois de um tempo, por causa das crianças, acabei aceitando a minha condição”, emociona-se.
A história da canoense Clara é semelhante a de milhares de mulheres brasileiras. Além de sentirem medo de denunciar o companheiro ou de sair de casa, elas ainda se sentem desprotegidas. “Vizinhos e parentes sabiam da minha situação, mas nunca recebi ajuda de ninguém”, ressalta Clara. Os dados do Instituto Maria da Penha, que utilizam como base a pesquisa do Fórum Brasileiro de Segurança Pública, apontam que a cada dois segundos uma mulher é vítima de violência física ou verbal no Brasil.
A grande mudança na vida de Clara só aconteceu quando ela conheceu a rede de enfrentamento à violência contra a mulher de Canoas. Após passar pela Delegacia da Mulher, ela e os filhos foram encaminhados à Casa Abrigo das Mulheres em Situação de Violência, que retira a vítima do convívio do agressor e oferece um atendimento integral. A Casa recebe, principalmente, mulheres em risco de morte iminente. “Nesse local, conheci outras mulheres que passaram pela mesma situação que a minha e descobri que tenho condições de reconstruir a minha vida. Tenho sonhos grandes porque, hoje, me sinto empoderada”, enfatiza. Clara quer continuar os estudos e pretende se formar em assistência social para ajudar outras mulheres, assim como foi ajudada.
Os relatos de mulheres que sofrem violência doméstica resguardam um ponto em comum: a falta de apoio. O município de Canoas, entretanto, oferece uma ampla rede de ajuda e proteção a meninas e mulheres em situação de violência. Entre os locais, destaca-se o Centro de Referência da Mulher (CRM) Patrícia Esber, que é referência estadual e nacional por ser uma das redes de atendimento mais completas do Rio Grande do Sul. De acordo com a vice-prefeita, Gisele Uequed, a Administração trabalha para ampliar a política de enfrentamento à violência. “Com o atendimento especializado garantido, a nossa preocupação passou a ser um público que ainda não era atendido: adolescentes entre 14 e 18 anos, que são igualmente ou mais expostas às violências de gênero. Percebemos que essas jovens estão em um contexto ainda maior de vulnerabilidade, uma vez que possuem maior dependência financeira, menos autonomia e figuram em uma faixa etária com restrição dos mecanismos de proteção”, explica Gisele.
Segundo o Observatório de Segurança Pública de Canoas, o município não registrou casos de feminicídio no ano de 2018. “Embora os dados sejam positivos, o que demonstra a eficácia da rede, o nosso foco, agora, é com a prevenção da violência e capacitação ao trabalho de quem está em risco, por isso, queremos atuar junto às adolescentes, intensificando e melhorando nossos serviços”, completa a vice-prefeita.
Para a diretora de Políticas para as Mulheres, vinculada à Secretaria Municipal dos Direitos Humanos e Participação Social (SMDHPS), Ana Moraes, embora tenhamos uma robusta legislação em prol das mulheres vítimas da violência doméstica e familiar, enquanto não houver uma transformação cultural, os índices de violência vão continuar crescendo. “Os projetos que a Diretoria vem desenvolvendo no município de Canoas, por meio de palestras, blitz educativa e demais campanhas institucionais visam a conscientização da sociedade de modo geral, na redução de toda forma de violência contra mulheres e meninas”, pontua Ana.
Além do Centro de Referência e da Diretoria, o município ainda conta com a Delegacia Especializada em Atendimento à Mulher (DEAM), a Delegacia de Polícia de Pronto Atendimento (DPPA), a Sala Lilás no Hospital Universitário, o Centro de Referência no Atendimento Infantojuvenil (CRAI), a Casa Abrigo das Mulheres em Situação de Violência, a Defensoria Pública de Canoas, o Foro Central e Juizado Especializado de Violência Doméstica e Familiar Contra a Mulher e o Conselho Municipal dos Direitos da Mulher (Comdim). A Prefeitura ainda está desenvolvendo um projeto para reativar a Patrulha Maria da Penha, que tem o objetivo de oferecer ainda mais segurança às vítimas e contribuir para a efetividade das ações no combate à violência.
Confira os locais de assistência à mulher em situação de violência
A Diretoria de Políticas para as Mulheres é o organismo municipal responsável por articular, coordenar e monitorar as políticas municipais para as mulheres. Os objetivos são eliminar todas as formas de violência e fortalecer a autonomia das mulheres, por meio da garantia do acesso a direitos e de oportunidades de qualificação para a inserção no mercado de trabalho.
Endereço: Rua Domingos Martins, 261, sala 806 – Centro
Telefone: (51) 3427-1902
Centro de Referência para Mulheres em Situação de Violência Patrícia Esber (CRM) – oferece um serviço de acolhimento e acompanhamento da mulher em situação de violência.
Endereço: Rua Siqueira Campos, 321 – Centro
Telefone: (51) 3464-0706
Delegacia Especializada em Atendimento à Mulher (DEAM) – é o órgão responsável por registrar e representar ao Judiciário contra o agressor.
Endereço: Rua Humaitá, 1120 – Marechal Rondon
Telefone: (51) 3462-6700
Delegacia de Polícia de Pronto Atendimento (DPPA) – é um espaço de pronto atendimento a mulheres em situação de violência, junto à Delegacia.
Endereço: Rua Dr. Sezefredo Azambuja Vieira, 2.730 – Marechal Rondon
Telefone: (51) 34259015
Sala Lilás do Hospital Universitário – realiza atendimento médico às mulheres vítimas de violência sexual.
Endereço: Avenida Farroupilha, 8001 – São José
Telefone: (51) 3478-80000
Centro de Referência no Atendimento Infantojuvenil (CRAI) – inaugurado em maio de 2018, presta serviço multiprofissional a crianças e adolescentes com até 17 anos, vítimas de violência. No Rio Grande do Sul, além de Porto Alegre, apenas Canoas disponibilizará o atendimento no Hospital Universitário. O CRAI oferece uma assistência unificada de proteção integral e redução de danos, que evita a revitimização da criança ou adolescente em relação ao atendimento.
Endereço: Avenida Farroupilha, 8001 – São José
Casa Abrigo das Mulheres em Situação de Violência – é o local para onde as mulheres com risco iminente de morte são encaminhadas de forma temporária. O endereço do local é sigiloso.
Defensoria Pública de Canoas – presta assistência jurídica gratuita e solicita ao juiz medida protetiva às mulheres encaminhadas pela Delegacia da Mulher.
Endereço: Rua Coronel Marcelino, 25 – Centro
Telefone: (51) 3472-0366
Foro Central e Juizado especializado de Violência Doméstica e Familiar Contra a Mulher – é o órgão do Judiciário responsável pelo julgamento das medidas protetivas de urgência e dos casos de crime da Lei Maria da Penha.
Endereço: Rua Lenine Nequete, 60 – Centro
Telefone: (51) 3472-1182
Conselho Municipal dos Direitos da Mulher (Comdim) – é o órgão fiscalizador e propositor das políticas públicas para as mulheres.
Endereço: Avenida Guilherme Schell, 6068 – Centro
Telefone: (51) 3476-4847